Estou a ficar com os nervos em franja de Humberto Faísca |
OPINIÃO |
"Estou a ficar com os nervos em franja" de Humberto Faísca, às sextas-feiras, às 10h10, 15h10, 23h10 e 3h10, na Alternativa Rádio.
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O bico está a ir … responsáveis a assistir…Parece que alguém está disposto a ver o bico desaparecer, parece que estamos dispostos a ver a história o Património e as memórias de dezenas de gerações desapareçam como se não fosse um dever dos atuais, preservarem o que lhes foi deixado.
Sei bem que para alguns a determinação em mudar completamente a malha urbana da cidade e a sua historia e raízes é tao grande que o património seja ele lá qual for é sempre um empecilho e uma dificuldade ao postal turístico e à visão de cidade para os outros, que não os barreirenses. Sim, estou a falar do bico do mexilhoeiro, sitio que constitui de certeza um valioso património cultural e natural onde se pode vivenciar os restos dos pontos de embarque dos vapores do tejo e do sado e da paisagem e memória que é obrigatório e fundamental proteger. Bico do mexilhoeiro situado entre o rio e a caldeira com as suas salgadeiras está hoje nitidamente a ser comido pelas aguas do tejo, fruto de um total abandono e falta de manutenção e investimento que preserve a sua naturalidade, agravado com a externa erosão provocada pelos motores dos catamarans que provocam uma mais rápida erosão e alteração dos depósitos de areia do tejo. Mas o bico é tudo isso, mas também é, parte da vida de milhares e milhares de camarros. Quem da minha geração não guarda historias dos excelentes assados ou das belíssimas enguias fritas degustadas em chão de cimento e mesa corrida, quem não guarda memorias dos namoros noturnos e das noites inesquecíveis do barraca bar. Eu pessoalmente guardo nas minhas memorias as tardes passadas na barraquinha do Sr. Ferreira lado a lado com o cheiro da maré, das tardes passadas com um dos embaixadores permanentes do areal do bico, o Pica, e quase que aposto que até o Brocas o cão do Pica saberia que se nada se fizer agora e já, o bico vai desaparecer e com ele todas as historias nele contidas. O bico faz também parte da cultura piscatória barreirense como também da cultura da musica da pintura do desporto e da fotografia, Faz parte da nossa memoria e da paisagem, não proteger tudo isto é no mínimo um atentado ao nosso passado presente e futuro. Bico do mexilhoeiro, presente sempre em todas as imagens de promoção da cidade, aquele pedaço de identidade que é o primeiro a observarmos quando de barco chegamos ao Barreiro, estamos em casa, o ultimo quando saímos e nos despedimos com um até já. O bico transmite aos barreirenses esse factor de identidade, esse cheiro a terra esse porto de abrigo. Mas hoje o bico é também porto de abrigo de quem lá é obrigado a morar, fruto das necessidades que a vida obriga, ou melhor, as necessidades que este modelo de sociedade neoliberal, capitalista obriga. Hoje em processo de demolição devido à visível falta de investimento na manutenção do espaço, fundamentalmente na proteção à erosão das areias e proteção da muralha os antigos equipamentos de apoio à pesca estão a ser demolidos, problema que hoje devido às dificuldades de acesso à habitação alguns desses espaços são usados como habitação permanente de pessoas, são vários os apoios de pesca que tiveram de ser transformados em habitação permanente. A sua demolição coloca varias pessoas em situação de sem abrigo, urge então garantir que essas pessoas não sejam esquecidas, relembro aqui as palavras do vice presidente da autarquia, para que as mesmas não sejam esquecidas pelo próprio. a APL “poderá decidir-se pela erradicação [de futuro] das construções” e, se for esse caso, a autarquia terá de fazer um levantamento da situação de quem ali permanece. “Uma coisa são as pessoas que estão eventualmente a usar aquelas construções para viver, outra são as que as utilizam para criar armazéns”, realçou, afirmando que “essa distinção tem de ser bem-feita para minimizarmos todos os impactos que possam surgir”. É urgente intervenção de modo a preservar o bico do mexilhoeiro, é necessário garantir a manutenção da naturalização do espaço bem como a solução dos problemas sociais nele existentes, como dizia Augusto Cabrita que se proteja o ambiente e a paisagem, sem grandes intervenções que alterem a sua naturalidade, com as salgadeiras e tudo o mais que de natural ai se encontra. Texto de Humberto Faísca |